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sexta-feira, 8 de janeiro de 2021

2021: MUITO OU DEMAIS?

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Depois do absurdo deste ano conturbador, difícil ser sucinta ao pensar sobre o ano que vem. Como Belchior, o que penso sobre 2021 é que “vejo vir vindo no vento cheiro de nova estação”, com tudo o que isso pode significar.
Entendo que a ferramenta com a qual teremos que lidar, ano que vem, é O Mundo. O arcano XXI é, em geral, visto como algo maravilhoso, mas penso que essa é uma análise superficial, quando paramos para refletir sobre seu universo de conceitos: fim de etapa, dança e celebração, integração com a vida e com o todo, festa de conclusão, viagens, a conexão com o que há para além do nosso cotidiano... Esses são alguns atributos que falam do que considero seu luminar. Porém, seu lado sombra (e a sombra de todo arcano anda sempre junto, posto serem as partes que, integradas, compõem o todo, exatamente como se dá conosco), aponta dispersão, falta de visão, euforia e posterior anticlímax, alienação, excessos, esgotamentos e, como em quase toda festa, a possibilidade de alguns arrependimentos e... ressacas. De modos que a primeira pergunta que poderíamos nos colocar é: De que forma vivemos uma festa? De que forma EU vivo festas? Na verdade, de que forma processo as celebrações e os finais?
O ano de 2020 abalou profundamente a todos nós. A psique não suporta o isolamento, a ausência das relações afetivas e fraternas, a solidão forçada, a cela onde o cenário é sempre igual, a imobilidade, o home office que não permite mais o café com o colega. Não por nada em cada dez nove pessoas aumentaram de peso, beberam demais e, literalmente, quase morreram de medo. Crianças surtaram, adultos surtaram, o aumento dos casos de depressão, violência doméstica e suicídio foram alarmantes. Viramos hordas de apavorados, perdidos, e, portanto, extremamente vulneráveis à desinformação e aos falsos profetas. Lidar com informação e contrainformação alternando-se diariamente é literalmente enlouquecedor. Fomos confrontados com os mortos pipocando em meio aos vivos e forçados a contemplar nossa própria finitude – não mais como uma lenda urbana, mas como fato.
Este ano (como calculei, posto ter considerado que a ferramenta que nos seria colocada seria O Julgamento), fez-nos uma convocação: A vida tem fim; quem é você? Para quê está aqui? Vive de acordo com sua real natureza ou arrasta-se seguindo os outros, desperdiçando a si mesmo? Que sentido percebe em sua encarnação?
Acima de tudo, a meu ver, 2020 nos deu um ultimato existencial. Ano que vem, portanto, deveria ser a celebração e o júbilo pelo afrouxamento da tensão que se segue a tão rica, porém dura avaliação. E, penso, em alguns sentidos o será.
Sabe-se mais como tratar o vilão. Perdemos menos pessoas para as intubações precoces do que em Março e Abril. Aprendemos quais medicamentos podem ser aplicados antes de apenas enfiar alguém num respirador. Hoje, sabemos mais.
Mas o problema é que o ser humano é, sempre que pode, egocêntrico e superficial. Porque sabemos mais, cuidamo-nos menos, arriscamos mais. Esse é um dos nossos grandes problemas e que, creio, aumentará em 2021: a negligência que advém do rompimento do dique de tensões e de uma ótica fragilizada e ávida por prazeres.
Penso que o primeiro semestre, especialmente a partir de Março/Abril, trará, sim, pese à exaustão geral, a sensação de festa próxima, uma alegria antecipada pela esperança e alguma provável ilusão, emoções comuns à exacerbação dos ânimos pelo afrouxamento do cativeiro. Vacinas, para muitos, trarão a exaltação dos temperamentos, a nova estrutura que foi apresentando-se ao longo de 2020 será revisada e então definitivamente implantada (mundialmente, aliás) nas dinâmicas de trabalho, nas relações sociais e afetivas, nos planos de vida. Como nos primórdios da aids, tanto casais quanto empresas pedirão testes e isso será visto como algo bom; ter um teste negativo será quase um novo status. Facilmente esqueceremos o caos e a convocação existencial de 2020 e a transformação profunda que ele trouxe ao mundo. Por um tempo, essas novas diretrizes nos darão a sensação de relaxamento pelo retorno a alguma ordem.
Como disse, no geral isso será bem-vindo. Mas o conceito do arcano XXI de “finalização” aplica-se a muito mais. A economia deve sofrer mudanças significativas, para não dizer radicais; serviços básicos tendem a colapsar; a liberdade individual ainda sofrerá com a catequese do “bem comum”; a violência que surge numa turma animada demais pode eclodir, como os bêbados felizes que ao saírem dos bares arranjam encrencas justamente porque estão sob uma euforia esmagadora; o antagonismo da dualidade separatista que ancorou entre nós há alguns anos pode chegar ao ápice. Vendavais, chuvas fortes, raios e trovões e tremores de terra também devem aumentar. Claro, isso ocorre sempre, mas O Mundo traz os 4 elementos em seus símbolos e, nesta minha meditação, eles aparecem como uma indicação de que precisamos ficar especialmente atentos.
Para quem trabalha com cabeças e emoções, 2021 deverá ser especialmente complexo. Quem aplica profissionalmente abordagens terapêuticas, seja de áreas Psi, oráculos ou outras terapias, acredito, trabalhará mais a partir de Março/Abril. E verá que será muito difícil fingir que não detecta, em seus clientes ou pacientes a priori recompostos e confiantes, as rachaduras psíquicas, as frestas mal tapadas, as angústias e ansiedades transbordantes, a sensação de perda de sentido, mesmo quando aparentemente tudo na vida do cliente finalmente “voltou a ir bem”. O que acontece, a meu ver, é quem não foi capaz de elaborar e adequar o que 2020 trouxe e que, assim despreparado, entrar na “fase festa” de 2021, não entenderá porquê não se sente bem, já que agora que “tudo ficou em ordem”, na prática nada parece estar em ordem e ele continua a sentir-se apreensivo, ansioso, angustiado etc.
Precisamos, antes, compreender melhor o que nos aconteceu. Crianças e adolescentes foram forçados a olhar para a vida por um viés torto: o do terror diário. E é essencial entender que não, não é ok crescer pensando que seu amigo pode ser o portador de algo nocivo. Não é ok crescer temendo o mundo e a vida, temendo pacotes de supermercado, temendo existir sem máscara. É simplesmente fatal e modificador, neurologicamente inclusive. E, também para os adultos, a descarga de adrenalina e cortisol foram constantes e isso afeta nocivamente mente e corpo.
Ano que vem esses dois desvios históricos do caminho humano, o advento do universo digital e o mundo pandêmico, estarão unidos dentro de muitos, transbordando mentes e trazendo a melancolia da frustração pelas consequências de algumas mudanças, como, por exemplo, a questão das interações sem raiz. A somatória desses eventos (mundo digital + pandemia) intensificou a insegurança dos pseudo contatos afetivos (Tinder etc) bem como as relações absurdamente impessoais no campo profissional que o home office impõe. E, uma vez que se cruza o limiar e nos sentimos autorizados a descartar pessoas apenas por caprichos e impulsos (o que já vinha ocorrendo, mas que 2020 praticamente ratificou), é difícil retornar ao ambiente interativo mais humano ou “analógico”, porque ele implica em autenticidade e responsabilidades, enquanto o digital permite avatares mitômanos e total descaso ou desconexão.
Porém, sempre digo que sou acidamente realista, mas sou fundamentalmente otimista. Pese a todas as penumbras que vislumbro por trás de uma primeira alegria, sei por experiência que é possível acessar um arcano e lidar com ele trabalhando para amplificar seu luminar e amenizar sua sombra. E tenho visto muitas pessoas sensatas abordando as mudanças de formas criativas, humanas e empáticas. E, se um bater de asas pode provocar um tsunami, cada ser que for capaz de viver o júbilo da mudança sem se perder no seu complementar radical, elevará seu entorno. Prevejo, inclusive, que mesmo dentre os que discordamos, mas cujo intuito nos iguala em relação à melhoria do ser, haverá uma conexão benéfica que atuará como moderador de festas, permitindo o desafogo e a celebração, mas impedindo a dispersão e o descontrole.
Em 2021, portanto, minha sugestão é que você procure, sim, todas as formas de sentir-se feliz novamente, porque é uma liberação merecida e conquistada. Mas interceda, exatamente como numa festa, de forma alegre e fraternal, quando vir alguém pirar demais em meio ao barulho da banda e ao descalabro da rua. Não é patrulha; é só temperar e equilibrar para o mundo não entornar.
De toda essa travessia feita a duras penas pelo vale da morte de 2020, no fundo a maioria de nós emergiu uma pessoa mais consciente do outro lado. Agora, comemoremos tudo que for possível. Mantenha uma escuta respeitosa, adapte-se aos novos tempos e reabra interações presenciais ainda que cuidadosas, porque elas serão mais necessárias que nunca.
Abra a cabeça, pense grande novamente, planeje novos caminhos e celebre o game de estar vivo. Volte a desejar, volte a não temer. Nem muito nem demais, apenas alcance a justa medida do júbilo. Então haverá algum tempo de rir, um prêmio pela superação.
Ivana Mihanovich
Taróloga, tarô-terapeuta, escritora, publicitária, estudante autodidata de Psicanálise e Psicologia Analítica, capacitação em Neuropsicologia.
Texto originalmente publicado no site Clube do Tarô: http://www.clubedotaro.com.br/.../previsoes-2021--muito...